De James Hilton
Em meio a uma guerra (que não é muito abordada no livro), um grupo de quatro pessoas + piloto sai em evacuação com o objetivo de fugir do conflito, indo para não lembro onde, hih. Fato é que os quatro passageiros de diferenças gritantes entre si não chegam ao destino previamente estabelecido, uma vez que o piloto acaba se revelando um sequestrador que os leva para Shangri-la, uma aldeia em meio a montanhas extremamente desconhecidas e inexploradas no Tibete. Os quatro, Conway, o principal, Bernard, um criminoso fugidio, Mallinson, um jovem altivo e impaciente, e Ms. Brinklow, uma missionária, após a morte do piloto sequestrador, se veem perdidos em meio a uma cadeia montanhosa de clima frio e impetuoso, até que um grupo de lamas, habitantes de um mosteiro, aparece e os leva para conhecer a tão peculiar instalação localizada naquele fim de mundo horizonte perdido.
Durante o longo tempo à espera de carregadores que supostamente os levariam de volta a suas origens, a dinâmica do mosteiro passa a ser paulatinamente familiarizada aos novos e temporários só que não inquilinos, sob a supervisão de um lama chamado Tchang. No entanto, somente Conwya passa a conhecer de fato o real significado de todo aquele lugar de ares encantados, pois, por algum motivo, é o único que o grande chefe supremo do mosteiro deseja conhecer e com quem fala face a face.

É isso mesmo, o mosteiro é como uma espécie de redoma que deverá seguir inexpugnável à destruição da sociedade para depois servir de salvação à mesma.
Conway também é o único a saber que, na verdade, os quatro estão lá não por acaso, mas como resultado de uma prévia escolha; eles são especiais, foram chamados para entrar no rol de habitantes do mosteiro com a missão de adquirirem sabedoria e conhecimentos no tempo em que habitarem o lugar, para no futuro, após todo o conflito que sobrevirá sobre a humanidade, transmitirem essa mesma sabedoria e conhecimento àqueles que sobreviverem.
''Aqui ficaremos com nossos livros, nossa música e nossas meditações, conservando as frágeis elegâncias de uma época moribunda e buscando a sabedoria de que os homens hão de precisar quando tiverem esgotado todas as suas paixões. Temos uma herança a conservar e transmitir. Tiremos dessas coisas todo o prazer que pudermos, até que venha esse dia.''
Por isso o local é como um centro de preservação de milhares de livros, discos e toda forma de arte. No entanto, esse não é o único segredo do mosteiro; passamos a ver que, por uma razão singular que não revelarei aqui, a velhice e juventude também possuem, naquele lugar, uma mutabilidade em relação ao resto do mudo.
E é aqui que paro de descrever a história, se não darei muito mais spoilers do que os que você já encontra nessa resenha.
Sabe, eu demorei a me envolver porque o livro demora a nos revelar o real intento do mosteiro; quando este passou a ser conhecido por mim, fiquei um tanto maravilhada por sua perspectiva. Porque isso sempre foi uma espécie de sonho secreto e obviamente inatingível pra mim.
O que eu quero dizer com isso? Bom, as atividades dos habitantes do mosteiro basicamente se resumem a leituras, estudos sobre arte e música e plena contemplação das culturas e conhecimentos que a humanidade cultivou ao longo de sua trajetória, e eu, Carolina, não vejo nenhuma outra ocupação de vida com tão bons olhos quanto enxergo essa. Fiquei imaginando o contentamento que eu teria em poder me desligar de uma rotina cansativa de trabalho que consume nós, cidadãos em sociedade, ou de eventos sociais esdrúxulos que não me atraem mas nos quais compareço pela exigência implícita de socialização, ou mesmo de todo tipo de gasto tediante e vazio que temos -que somos obrigados a ter- com nosso tempo, pra poder simplesmente ficar fazendo isso: lendo e aprendendo. Imagina que bom poder não se preocupar com contas a pagar, idas ao mercado, contratos sociais, provas de vestibular, salário insuficiente no fim do mês e tantas outras coisas que enfrentamos e, em vez disso, se dedicar sem medida a leituras prazerosas, músicas lindas a escutar e quadros artísticos a observar! Seria tão prazeroso!
Eu sempre tive esse apelo em mim, essa vontade de largar tudo, dar adeus às responsabilidades exaustivas só pra poder, olha só, ficar lendo, ouvindo música e mergulhando em todo tipo de cultura que está aí no mundo, pronta pra ser explorada na forma escrita, musical e artística. Quantas vezes não desejei poder fazer isso, poder me dedicar só a estudos pelo simples prazer de aprender, a meus livros tão amados e mais nada, sem me preocupar com a falta de tempo ou disposição e excesso de cansaço... É uma espécie de sonho meu que, infelizmente (ou não, não sei), jamais poderá ser alcançado. Porque as responsabilidades batem na nossa porta e precisam ser cumpridas. Porque o mundo exige. Porque a sociedade exige. Porque assim é.
O livro acaba e ficamos sem saber se foi um sonho, se Conway viveu tudo aquilo mesmo ou se é, como é pra mim, uma ilusão que ele projetou de tanto querer em secreto. Não sabemos se é real, não sabemos se todos aqueles livros, música arte e cultura realmente estão sendo cuidados como herança naquele lugar, não sabemos nada.
O que sei é que pode parecer um tanto omisso esse desejo, um dane-se ao que devo (ao que todos devemos) fazer e que não pode ser deixado de lado, porque a vida exige e ponto, e entendo essa exigência; mas não consigo deixar de pensar no quão bom seria poder, um dia, fugir um pouco de toda essa loucura que é a vida, de todos os papéis que temos que desempenhar nesse palco imenso, pra poder passear por umas montanhas no Tibete e, em meio a neve, frio, vento e busca por uma fuga de tudo, encontrar esse lugar encantado, esse horizonte perdido e especial, diferente de tudo, essa Shangri-la que eu adoraria, por um tempo ou pra sempre, poder habitar.
''Mas de repente sentiu que todos, ali, eram atore num palco imenso, cujo pano de fundo só ele avistava, e, como não pudesse comunicar o que sabia, assaltou-o repentino desejo de estar só.''
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